Sou
velho.
E isso me surpreende todos os dias. Sempre estranho a figura que vejo no
espelho, enquanto lavo o rosto. Imaginava que eu teria mais cabelos. E os fios
que me sobram, não os supunha tão brancos.
É assim que inicio a batalha de todos
os dias: com uma briga entre o que sou e o que penso que sou.
Quando em algum balcão burocrático preciso responder qual a cor de meus cabelos, ainda tenho a tendência de escrever “castanhos”. Se me corrijo a tempo e assinalo “brancos”, bate uma nova dúvida: não seria melhor deixar claro que sou calvo?
Quando em algum balcão burocrático preciso responder qual a cor de meus cabelos, ainda tenho a tendência de escrever “castanhos”. Se me corrijo a tempo e assinalo “brancos”, bate uma nova dúvida: não seria melhor deixar claro que sou calvo?
Minha
velhice não é novidade. Sei direitinho quando ela começou. Foi num cinema em
Nova York. Não me lembro o nome do filme a que assisti. Mas me lembro muito bem
da reação da mocinha da bilheteria _ quantos anos ela tinha? 13? _ ao olhar para
a minha fisionomia e concluir: “é sênior”. Não me perguntou nada. Estava na
cara. De acordo com minha certidão de nascimento, ainda faltavam alguns anos
para eu atingir tal categoria. Mas ela não teve dúvidas, e me vendeu meia
entrada.
Quando, enfim, atingi o marco que me inclui no grupo da terceira
idade, resolvi não rejeitar nenhuma das concessões que se adquire nesse estágio.
Pago meia nos teatros, escolho as filas preferenciais em bancos e supermercados
e entro de graça no MASP em São Paulo. Afinal, alguma vantagem há de se ter com
a velhice.
Não tenho pensado na velhice por acaso. Na última quarta-feira,
escrevi uma coluna criticando a ação dos Black Blocs. Minha intenção era só dar
uma opinião. Agora, percebo que foi uma ousadia. No meu blog, vários
participantes de passeatas que apoiam a violência do grupo me acusaram de ser...
velho!
“Envelheceu mal, hein?”, explicitou um deles. Pode ser. Mas lendo o apoio de alguns da minha geração aos atos violentos que estão sendo vistos na ruas, posso concluir também que há os que rejuvenescem mal.
“Envelheceu mal, hein?”, explicitou um deles. Pode ser. Mas lendo o apoio de alguns da minha geração aos atos violentos que estão sendo vistos na ruas, posso concluir também que há os que rejuvenescem mal.
É difícil explicar o
apoio à violência. Uma leitora tentou fazer com que eu entendesse como sou
alienado: “A coisa só vira mesmo tirando gente como você do conforto da sua
mesinha com computador da última geração e ar condicionado geladinho e fazendo
encarar a realidade do que é ter necessidades primárias.”
Sobre o computador de última geração e o ar condicionado geladinho, vou ter que fazer compras para não decepcionar a leitora e passar a ter o cotidiano que ela imagina que eu possuo. Isso se ainda tiver no comércio algum computador ou aparelho de ar condicionado depois da passagem dos Black Blocs pelas ruas.
Sobre o computador de última geração e o ar condicionado geladinho, vou ter que fazer compras para não decepcionar a leitora e passar a ter o cotidiano que ela imagina que eu possuo. Isso se ainda tiver no comércio algum computador ou aparelho de ar condicionado depois da passagem dos Black Blocs pelas ruas.
Quanto ao resto,
não vejo muita gente com necessidades primárias no meio dos mascarados de preto.
Li no jornal um caso exemplar: um pai mostrava-se preocupado com a filha, de
vinte e poucos anos, que foi identificada pela polícia como Black Bloc. Não há
nada de muito concreto contra ela. Mesmo assim, o pai e a menina, aproveitando
que ela está passando férias num país da América do Sul, combinam de ela pedir
asilo político na Argentina para não ter que enfrentar as autoridades na volta
das férias. Necessidades primárias?
No meu tempo, isso se chamava filhinha do
papai. Faz a bobagem e, quando a porca torce o rabo, pede a ajuda do papai. Devo
estar errado.
Porca torcendo o rabo é coisa de velho.
FONTE: Blog do
Xexéo
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